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A COLHER DE SANTA MARTA

No Museu Municipal do Crato, há uma imagem de Santa Marta que recebe a atenção de todos os visitantes porque tem na mão direita uma colher de prata, destoando totalmente do resto da imagem e, inclusive, de todo o espólio ali guardado e exposto. Questionado sobre o anacronismo, o técnico superior do município e principal responsável pela instalação e manutenção do espaço museológico, confirmou a “desconformidade” justificando-a com o facto de a estatueta ter sido doada ao Museu, com o referido adereço e não ver razão fundada para lho retirar. “A colher justifica-se pelo facto de Santa Marta ser cozinheira!” Acrescentou ainda que tal facto constitui um motivo de interesse adicional. “É normal, ao saírem, os visitantes perguntarem por que razão há uma imagem medieval com uma colher de prata na mão” o que aumenta a curiosidade do espaço. Surpreendido por qualquer uma das justificações, confesso, resolvi aproveitar tal facto para, com o título, chamar a atenção do leitor, para este texto que, obviamente, não pretende ficar por esta estranha ocorrência, mas ir um pouco mais além, como a seguir, farei. Guiados pelo credenciado especialista em história de arte, Jorge Rodrigues, técnico superior da Fundação Gulbenkian, aposentado e antes de rumar ao extraordinário Mosteiro de Santa Maria da Flor da Rosa (sede do priorado da Ordem do Hospital, e mais tarde de Malta), estendemos a visita à Igreja Matriz da vila alentejana. Entre várias curiosidades e motivos de interesse, a grande novidade aparece no telhado do templo com o remate dos vários pináculos com acrotérios devidamente decorados com figuras de anjos e santos. O mentor de tal “novidade” renascentista terá sido D. Luís de Portugal, Duque de Beja, grande mecenas da vila onde estava sedeada a Ordem de que era prior, por decisão real do seu irmão D. João III. “Em Portugal só existem num outro lugar: Torre de Moncorvo!” A pergunta era óbvia: “Porquê Moncorvo? Terá algo a ver com o facto de o culto e rico irmão do rei ter casado, nesta vila do nordeste, com Violante Gomes, a Formosa Pelicana?”. O historiador não soube responder embora tivesse, de imediato, aceitado a tese como boa e a justificar mais investigação. Em prol desta teoria surgem, nos estremos das goteiras do telhado e igualmente patrocinadas por D. Luís, Prior do Crato, exuberantes e assustadoras gárgulas, em tudo idênticas às que ornamentam os topos do telhado da Basílica de Moncorvo. Tendo em vista o poder económico do Duque, uma das figuras de proa do me- cenato artístico renascen- tista, sobretudo em obras de pendor religioso, tais factos podem contrariar teses sobre a promoção e financiamento da mo- numental Igreja de Nossa Senhora da Assunção, do sul do nordeste trans- montano, atribuída aos ricos cristãos-novos desta localidade, dado que, ao contrário da do Crato, esta foi planeada e começada a erguer durante a vida do ilustre fidalgo. Moncorvo, cuja afirmação contem- porânea passa muito pela exploração da sua histó- ria e cultura, muito teria a ganhar com o aprofundamento desta ligação histórica!

Manchas – são todas iguais?

Vou começar pelas mais conhecidas, as efélides, popularmente chamadas de sardas, são pequenas manchas escuras, muito frequentes em áreas expostas da pele, como o rosto e a região do decote. São mais comuns em pessoas de pele mais clara e ruivas e são devidas ao aumento excessivo de melanina (pigmento que dá cor à pele), causadas pela exposição continuada da pele ao sol e, por isso, tendem a escurecer mais durante o verão e a desvanecer no inverno. São muito comuns em crianças e até mesmo em adultos, mas têm tendência a desaparecer com o passar do tempo. Outras manchas que deve conhecer são os lêntigos solares, também conhecidos como mancha senil ou melanose solar. São manchas planas e de coloração acastanhada ou cinzenta, geralmente redondas ou ovaladas e com tamanho variável. Ao contrário das sardas, não desvanecem com o tempo e, geralmente, desenvolvem-se em adultos com mais de 40 anos, sendo muito frequentes na população mais idosa. Tal como o nome indica, na sua origem está a exposição desprotegida ao sol e o envelhecimento da pele. Por isso, aparecem mais em áreas expostas ao sol: rosto, dorso das mãos e braços. Depois da quarta década de vida, aparecem também outras manchas escuras na pele: são queratoses seborreicas, têm tonalidade castanha variável, são salientes, rugosas ao tato, com aspeto semelhante a uma verruga e podem crescer progressiva mas lentamente. Podem surgir na cabeça, pescoço, peito ou costas. São causadas pela proliferação benigna de queratinócitos, que são as células mais frequentes da epiderme (a camada mais superficial da pele), responsáveis pela síntese da queratina. As queratoses seborreias e os lêntigos solares são conhecidos como manchas da idade, de carácter benigno. Então e aquelas manchas grandes, escuras, que surgem na gravidez? Trata-se de Melasma! O melasma é uma condição adquirida, que tende a ser crónica e recorrente após tratamentos. Caracteriza-se por manchas hiperpigmentadas, castanhas ou castanho-acinzentadas, de contornos irregulares. Ocorre devido a uma produção anormal de melanina numa região específica. Embora a causa não seja totalmente conhecida, consideramse como fatores de risco: fatores genéticos, alterações hormonais como gravidez, alguns contracetivos orais e terapêutica hormonal de substituição na menopausa, doenças da tiroide, exposição à radiação ultravioleta (UV) e alguns medicamentos. Surge tipicamente entre 25 e os 45 anos, e muitas vezes a primeira manifestação surge na gravidez, sendo, nestes casos, conhecido vulgarmente por “pano” ou cloasma. É mais comum em mulheres, de cor de pele mais escura, embora também possa surgir em homens. O local mais comum de aparecimento é no rosto: bochechas, testa, nariz, por cima do lábio superior e queixo. Mais raramente, pode também surgir no pescoço e braços. Por ser uma condição crónica, não tem cura, pelo que exige tratamento inicial e cuidados preventivos ao longo de toda a vida. Para além da radiação ultravioleta, hoje sabe-se que também a luz visível e luz azul dos aparelhos eletrónicos agrava esta patologia, pelo que o uso de protetor solar de largo espetro, diariamente, é essencial, bem como a sua reaplicação ao longo do dia. Preferencialmente, quem tem melasma deve optar por protetores com cor, que conferem proteção adicional. E atenção: não é só a região afetada pelo melasma que deve ser protegida! A radiação UV no corpo agrava as manchas de melasma do rosto. Por isso, deve usar protetor solar em todas as áreas expostas ao sol, durante todo o ano. Esteja atento à sua pele. Esteja atento ao seu corpo. Esteja atento a si.

Marta Fernandes

(Médica especializada em medicina estética)

Medicina Geral e Familiar: A importância da prevenção e do acompanhamento adequado

A especialidade de Medicina Geral e Familiar tem a particularidade de acompanhar os utentes desde o nascimento até à morte, de acompanhar a saúde e a doença, de conhecer o seu contexto social e familiar ao longo de toda a vida e, assim, estabelecer uma relação de proximidade, de confiança e empatia, contribuindo para os melhores ganhos em saúde dos utentes. Citando a Organização Mundial de Saúde (OMS), que define saúde como um “estado completo de bem-estar físico, mental e social, e não apenas a ausência de doença”, é nesta perspetiva que se faz a abordagem ao indivíduo em Medicina Geral e Familiar, percebendo que à sua frente está sempre uma pessoa, com ou sem doença, mais do que um diagnóstico, um tratamento mais ou menos diferenciado, mas que também tem em conta o seu contexto social, familiar e psicológico e utiliza muitas vezes a relação médico-utente como aliança terapêutica privilegiada. Assim, falar da pedra basilar dos cuidados de saúde é falar das necessidades primárias da população e importa destacar a importância dos médicos de família, que têm o papel de proporcionar a todos oportunidades para uma vida longa e saudável, maximizando o seu potencial de saúde e orientando as doenças quando forem surgindo. Importa também aumentar o conhecimento e a literacia em saúde, fornecendo à população informação útil não só sobre a doença, mas também sobre estilos de vida saudáveis e formas de prevenção primária e secundária, já que a verdadeira saúde ultrapassa largamente a contabilidade das doenças. A maior parte de nós é saudável com episódios mais ou menos espaçados de doença, muitas vezes sem impacto significativo, no entanto, não devemos descurar a necessidade de cuidados e de diagnósticos atempados. No seguimento do anteriormente mencionado, importa falar sobre os programas de rastreio oncológico que existem, muitas vezes alvo de desconhecimento. Em Portugal, as doenças oncológicas constituem a segunda causa de morte, pelo que se compreende que os rastreios organizados sejam uma bandeira prioritária nos cuidados de saúde. O Plano Nacional de Prevenção e Controlo das Doenças Oncológicas está indicado em pessoas que não apresentam sintomas e tem como objetivo reduzir a morbilidade e a mortalidade por cancro, através de um diagnóstico mais precoce e melhorando a qualidade de vida e a satisfação dos utentes com os cuidados de saúde prestados. Em Portugal, a nível populacional, são recomendados os rastreios do cancro do colo do útero, do cancro da mama e do cancro colorretal. Estes rastreios têm demonstrado a redução de mortalidade aproximadamente de 30% no cancro da mama, 20% no cancro colorretal e 80% no cancro do colo do útero. Normalmente baseiam-se em exames simples e não invasivos. No caso do cancro de mama, o consenso inclui a realização de mamografia a cada dois anos, em mulheres dos 50 até aos 69 anos de idade. Relati- vamente ao rastreio do cancro colorretal, inclui o teste de pesquisa de sangue oculto nas fezes dos 50 aos 74 anos de idade em ambos os sexos. E finalmente, no rastreio do cancro do colo do útero, a população-alvo é constituída pelas mulheres com idades compreendidas entre os 25 e os 60 anos e é realizado através do exame de papanicolau, um procedimento simples e não invasivo. Ainda no contexto dos cuidados preventivos, destaca-se também, a importância da vacinação como um pilar fundamental na promoção da saúde. As vacinas desempenham um papel significativo na prevenção de doenças infeciosas, contribuindo para a proteção individual e coletiva da comunidade. Em última análise, a busca pelo conhecimento e a ação proativa são fundamentais para uma vida saudável e plena. Não subestime o poder da informação e da prevenção. Agende uma consulta com a sua equipa de saúde familiar para esclarecer quaisquer dúvidas e manter os seus exames de rastreio atualizados. Lembre-se, cuidar da sua saúde é um investimento va- lioso que pode salvar vidas.

Daniela Bento

Médica

Ovos da Páscoa política

No seguimento da empolgante eleição do novo presidente da Assembleia da República, Luís Montenegro, o novíssimo primeiro-ministro, presenteou a Nação com um delicioso ovo de Páscoa. À semelhança do simbólico ovo pascal, que é feito de chocolate e recheado de surpresas, o ovo governamental de Luís Montenegro, liberto que foi do habitual revestimento de celofane, mostrou ter sido confecionado com o melhor cacau partidário, desapontando os oposicionistas. Desapontamento que poderá crescer à medida que os portugueses lhe tomarem o gosto e, claro está, manifestarem agrado nos estudos de opinião que se seguirão. Ovo governamental que encerra muitas promessas, mas não inspira grandes esperanças, porquanto também comporta inúmeras dúvidas, sendo que a primeira é a sua duração, dado que poderá derreter-se logo que o tempo começar a aquecer. Ainda que igualmente possa manter-se bem conservado, por mais tempo do que o previsto e sem se deteriorar, no congelador em que PS e Chega, absurdamente, transformem o palácio de São Bento. Certo é que este ovo de Luís Montenegro sempre se apresenta mais tragável que o malcozinhado de António Costa que, como ficou provado e reprovado, era feito de cascas, raspas e sobras indigestas de governanças socialistas malpassadas. Também a nova situação política nacional tem a forma de um ovo amargo, sem ponta por onde se lhe pegue, tantos são os perigos que se lhe auguram. Branco é, o Regime Político o põe, será caso para se dizer. Ovo que o povo poderá esborrachar, quando menos se espera, nas cabeças dos principais actores do longo teatro eleitoral que terminou em10 de Março. Teatro que, se outro mérito não teve, serviu para melhor dar a conhecer a controversa classe política, representada por personalidades como Mariana Mortágua, a azougada coordenadora do Bloco de Esquerda, que não sabe bem o que quer para Portugal, nem para onde o quer levar; Inês Sousa Real, a vendedora de bíblias do Partido das Pessoas, dos Animais e da Natureza, que os eleitores deixaram só, a pregar aos peixes; o historiador Rui Tavares, o poeta do Livre, que encheu a campanha da melhor prosa; Paulo Raimundo, o novíssimo disc jockey do PCP que, como manda a tradição, virou o disco e tocou o mesmo; Rui Rocha, devotado missionário do virtuoso Iniciativa Liberal e Nuno Melo, o maestro trapalhão do ressuscitado CDS, agora promovido a cabo de guerra. Personalidades que à falta de ovos, vão continuar a mimar a democracia distribuindo amêndoas de Páscoa de todas a cores e para todos os gostos. Quatro personalidades maiores, porém, marcarão a vida política portuguesa nos próximos tempos: o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, desconcertante regente da banda presidencial, Luís Montenegro, o menino de coro do PSD que ousou tornar-se primeiro- -ministro, Pedro Nuno Santos, um robô produto da inteligência artificial socialista e o arruaceiro, ao que dizem, André Ventura, cacique do marginal, ao que consta, partido Chega. Personalidades que continuarão a planar sobre os três grandes conglomerados de cidadãos que presentemente compõem o eleitorado português: o Bloco Central, composto pelos fiéis do PS e do PSD, que têm governado e desgovernado Portugal; o Bloco da Abstenção, que continua desconforme, muito embora tenha diminuído significativamente e o Bloco do Descontentamento, de que o Chega já abocanhou parte significativa. Manda a verdade que se diga, a este respeito, que os mais de 1 milhão que votaram no Chega não o fizeram por serem fascistas, racistas, xenófobos ou saudosistas dos tempos da outra senhora, mas pura e simplesmente por não estarem minimamente contentes com o status quo, com as governanças do PS e do PSD, designadamente com a corrupção despudorada e sistemática, com o mau funcionamento da Justiça, com o estado lastimável do Serviço Nacional de Saúde, com a falta de habitações dignas, com o sem número de problemas que seria exaustivo aqui enumerar. Também não deixa de ser verdade que o Bloco Central, constituído pelo PS e pelo PSD, continua a recolher as maiores audiências, não só por consonância social e ideológica dos eleitores, mas sobretudo porque controla a comunicação social, parte e reparte o emprego público, vive em conúbio com a alta finança e se alimenta de clientelismo e nepotismo. Certo é que, a manter-se esta sistémica dinâmica negativa, o relapso Bloco Central irá definhar alegremente, o Bloco da Abstenção irá, felizmente, emagrecer e, lamentavelmente, o Bloco do Descontentamento irá aumentar, alargando os horizontes do Chega de André Ventura. Dinâmica que, tudo leva a crer, se manterá porquanto PS e PSD, continuam a não dar mostras de estarem interessados em se concertarem na promoção das indispensáveis reformas estruturais. Nada disto conduzirá, necessariamente, acalmem-se os espíritos mais exaltados, ao fim da democracia. Poderá até, bem pelo contrário, contribuir para o seu aperfeiçoamento.