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O que o povo quer é festa

Quando era rapazote ouvia dizer frequentemente que o que o povo queria era Fátima, Futebol e Festa. Outros diziam Fado, Futebol e Fátima. De um modo ou de outro eram os três ou quatro F’s mais adorados dos portugueses. No fundo, todos eles indiciavam uma associação a festividade, fosse ela qual fosse. Muitos anos se passaram e políticas de igual modo foram implementadas, mas nada alterou o que ao povo diz respeito nesta plataforma de entendimento. Continuamos a gostar de Fado, de futebol e de ir a Fátima, pelo menos uma vez por ano. Faz parte do nosso íntimo, da nossa crença e da nossa maneira de estar na vida. E claro que gostamos das festas. Quem não gosta dos grandes arraiais de Verão que em todas as aldeias se costumam fazer? Hoje, infelizmente, é o único dia em que as aldeias se enchem de gente, passe o eufemismo, porque afinal de contas, o arraial resume-se ao bailarico no centro da aldeia onde um conjunto musical se esforça por juntar e animar os poucos que se dignam estar presentes. Já não se dança como antigamente, já não se anda ao “engate” das raparigas novas porque as não há e os mais velhos, cansados da vida, limitam-se a apreciar de longe, os elementos do conjunto e as dançarinas que, em palco, dançam e saltam de saia curta e braços no ar. Mas haja música porque ela é sinónimo de festa, de alegria e de convívio e isto faz esquecer as agruras do dia-a-dia. Na verdade, as festas sempre tiveram duas vertentes muito importantes: a que serve de razão para a sua realização e a que leva as pessoas a afluírem ao local onde se realiza. Digamos que uma delas será talvez religiosa porque tem um patrono em honra do qual se faz a festa e a outra será a necessidade social que embrulha o sentimento das pessoas e as leva a procurarem e a reverem amigos e a conhecerem outros que o podem vir a ser. Mas não nos enganemos, pois nada do que era antigamente voltará a repetir-se nos dias de hoje. Não há gente. As aldeias estão despovoadas e os novos procuraram outras paragens. O seu regresso só é efectivo nas festividades de Natal ou da Páscoa e, claro, no Verão. São dias escassos para colmatar a falta que se faz sentir nas terras do interior. No litoral as coisas são um pouco diferentes. Há mais gente e é natural que as festas sejam mais concorridas. Este ano, completamente atípico devido ao Covid 19, não se realizaram as festas e os festivais que eram habituais e marcavam os meses de verão. O governo e a DGS acharam por bem e com alguma razão, impedir a sua realização. Contudo, isto não impediu que alguns desvarios acontecessem e que se tivesse de tomar medidas mais ásperas. Mesmo assim, houve sempre quem pensasse que o vírus era para ser encarado de frente e sem temor. O que era preciso era festejar. Dançar, saltar e beber até fartar. As consequências começaram a notar-se e não estão a ser nada agradáveis. Os números aí estão para confirmar que as coisas se estão a complicar cada vez mais. Mas não se pense que é só em Portugal. Não, não é. A Europa está à beira do abismo. Os desmandos que verificamos nos países europeus, também se verificam por cá. O que se passou em duas ou três ocasiões, não abona em nada, a justeza do governo ou mesmo da Direção Geral de Saúde. Todos criticaram o que se passou no Parlamento e na comemoração do 10 de Junho, mas fez-se. Todos falaram e falam da realização da Festa do Avante e dos riscos que podia trazer, mas fez- -se. Menos gente, mais distanciada mas, quase quarenta mil pessoas a passear- -se pelo terreiro é muita gente, convenhamos. Se não fosse a ameaça do vírus e as restrições impostas, seriam certamente o dobro de pessoas, como é habitual, mesmo com o vírus à porta, porque o que é preciso é Festa para descontrair. É disto que o meu povo gosta! Só tenho esperança que este gostinho especial, não se transforme num amargo de boca atroz.

Por quem os sinos dobram

O ambiente no País está quente porque o sol «baixou» levando em linha de conta o saber empírico da Dona Carminda, minha estimada sogra. Infelizmente já falecida. O ambiente diurno e nocturno está quente apesar do madeirense Sérgio Borges há um saco de anos ter avisado que : «Setembro chegou, o verão terminou». Os tempos são outros, de pandemia, os sinos dobram chorando, chorando, pelas centenas de milhares de mortos, pelas centenas de milhões de desempregados, pelas centenas de milhões de jovens desprovidos de esperança num futuro pleno de entusiasmo por estarem a diminuir as desigualdades de todo o género. Os dias estão crispados, agressivos, impacientes, a perplexidade cresce como crescem os cogumelos no tempo chuvoso, só não vê quem não quer ver, os dados a pensarem a causa das coisas vivem angustiados ante o valimento das «profecias» de George Orwell, raro é a semana que não surgem invenções a castrarem a nossa liberdade, a confinarem-nos ao cárcere do isolamento vigiados pelas plataformas manejadas sabe-se lá por quem. Por ninguém, escondido algures deixando uma ponta de um dos seus muitos rabos de fora a permitir a um qualquer chantagista bufar de modo a ser premiado sem escândalo ou protesto da República, o rocambolesco Rui Pinto é paradigma da «democracia» em curso. O notável prosador Tomaz de Figueiredo escreveu Procissão de Defuntos, está lá tudo quanto é a possibilidade de sermos indignos, eu sei, muito de nós sabem quão enorme é o desconhecimento da obra do émulo de Francisco Manuel de Melo, de Manuel Bernardes, do excelso António Vieira alvo da ira de crápulas analfabetos fanáticos estilo maoismo Pol Pot. O clima favorece os extremismos, a deturpação da linguagem, o banimento das normas de civilidade, os profissionais das televisões chochos de prosápia pontapeiam a senhoria na esteira do plumitivo – oh Manuel, sim José – estribado na besta estrangeirista. Os chochos só têm emenda com um arrocho de marmeleiro que é bambo e flexível. O Setembro deste malfadado ano (a fada má deu um beijo vampiresco, sedento do nosso sangue, à fada boa) prossegue na valorização da insanidade como se fosse um passeio aos domingos (José Régio, David Mourão Ferreira, enquanto esteve na tropa, e outros faziam-nos no sopé da Serra de São Mamede), e não é, é sim a bastardização do intelecto nuns descarada normalização rasteira propícia aos répteis de duas pernas perpetrarem negociatas pagas por um Zé Povinho sem energia capaz de produzir virulento corte de mangas. Há anos passei uns dias em Jerusalém, se a cidade por si só emana respeito e minuciosa observação, a sacralidade do Muro das Lamentações é pungente obrigando-nos a rememorar o fluir do profano no universo do sagrado, agora, em 2020, o desfastio relativamente ao sagrado acentua-se a cada dia que passa, os exegetas estudam e meditam, restam poucas vozes dignas de serem ouvidas, duas delas transmontana – Adriano Moreira e António Barreto –, só que Barreto tem sido atacado porque não teve pejo em parafrasear o Menino: rei vai nu. A ortodoxia passeia-se rotunda e segura que a vindima de Setembro será de boa qualidade. O Zeferino camiliano também foi vindimado! Os sinos, plangentes, continuam a dobrar!

Avó Julita

Boas tardes. Escrevi antes sobre uma tia, agora a avó. Talvez esta época estival me tenha dado para falar um pouco das coisas que me ligam ao nordeste. Sinto- -me um pouco aqui o vizinho Sr. Armando Fernandes - todos temos já um pouco de Lagarelhos dentro de nós - embora com menos vivências para a colecção e muito menos engenho para a descrição. Sou de outra geração que conheceu as aldeias já muito quietinhas, talvez excepto em Agosto, com antenas parabólicas, carros para ir ao café e voltar, e muito menos bosta de vaca espalhadas pelas ruas. Mas ainda me lembro de se apagarem as luzes à meia- -noite, medida que contribuía para a poupança de energia e para menor libertação de dióxido de carbono. Paradoxos dos tempos, hoje demasiado falamos, mas em algumas coisas nem tanto fazemos. A minha avó, Tia Julita, de nome Julieta, educou uma dezena de filhos sem saber ler nem escrever, dos quais dois não passaram além do Bojador que era superar o cabo das tormentas de recém- -nascer no Nordeste em meados do século passado. Mas adiante que minha avó sempre esteve para além da dor, inclusive no finalzinho quando os médicos a quem raramente precisou de recorrer lhe diziam para se manter sossegada por causa do coração teimoso que a empurrava todos os dias para passeios no termo ou mais que não fosse para arranjar algo com que enzonar na faceira junto de casa. Quando muito esporadicamente se via enjaulada nos apartamentos dos filhos não durava lá mais de três dias. Eu já conheci a tia Julita como avó de algumas décadas, toda vestida de preto, às vezes uns azuis escuros ou castanhos se o dia era festivo. A mim por vezes chamava-me “criatura” irritada por eu deitar as cerillas para as brasas da lareira e gostar de as ver a pegar fogo, esgotando-lhe as caixas. Quando eu aparecia sem aviso pela hora de jantar preparava-me em modo fast-food uma tomatada de comer e se pelar por mais que ninguém mais nunca soube reproduzir. Sopas de fideu, o pote e a travessa cheios sempre em íntima e fumegante parceria, uma mosqueira na cozinha, uma caldeira no lume sempre pronta a laborar com a ajuda da qual em tempos fazia sabão, um escano de costas largas, um banco comprido e meio tosco do qual se dizia ser o melhor para endireitar as costas, no Inverno o porco, o cheiro a tripas cozidas que eu abria para ela encher com a massa das alheiras, o fumeiro acabado de colgar a pingar no xisto, chavianos doces com um toque de mel, sempre uma fogaça no centro da mesa coberta por um pano, uma gata que entrava e saía pelo sobrado mas que nunca se deixava apanhar, manteiga e uma espécie de tuli-creme espanhol que vinha nuns copos de vidro guardados para os netos numa gaveta, raios de sol que furavam as telhas e fogo-cruzavam a cozinha, uma máquina de costura Singer, esquecido no canto de um quarto uma espécie de lavatório portável, debaixo da cama um penico de loiça, na cabeceira um grande álbum de fotografias de paradeiro actualmente desconhecido, em baixo uma porta com postigo às vezes aberto, um pátio com caldeiretas e melancias ou melões nas tardes de Verão, um pequeno lagar onde repousava lenha e uma despensa funda e cavernosa com ferramentas de trabalho e grandes bocados de carne de porco em salga numa casa em que, não sendo nada pequena para as casas daquele tempo, se acomodava muito mais gente do que cabe em qualquer casa de hoje em dia. Tudo isto nunca mais vi, senti ou comi desde que a minha avó partiu de um gole sem incomodar, como sempre, a porta de sua casa se fechou e as coisas por lá devem estar a aguardar e a envelhecer tal como eu me lembro delas. Antes dos tempos em que eu a conheci, diz que trabalhou sempre muito em casa e fora dela, às vezes fazendo pausas para parir e voltar ao trabalho se os dias eram de segada, deu abrigo aos fugidos da guerra civil espanhola que traziam medo, fome e piolhos, passou muitas noites adentro no contrabando para sustento da família e dizia que nessas clandestinas mercancias era alvo da cobiça de muitos espanhóis. Passava corda, camisas, tecido, sabão, café acho que não. Célebre no contrabando, reza a lenda que não foi apanhada uma única vez sequer, provavelmente graças aos responsos que a Tia Aurora lançava, sua vizinha, amiga e maior companheira no fintar nocturno de guardas e carabineiros, sendo que os responsos eram quem davam ou negavam autorização de partida pois se a água e os azeites lhe fizessem má cara nessa noite desse por onde desse já não saíam. Creio que a minha avó teve um coração muito bom para os filhos, principalmente quando os ajudava a lidar com as indisposições do meu avô, e para os netos ainda mais, nas férias grandes conseguia ter sempre uma nota de 20 euros para cada um, de tal maneira que eu me metia com um primo meu dizendo- -lhe que só ia visitar a avó Julita para receber a notica. Não havia pela aldeia quem não lhe quisesse bem, nas noites de Verão gostava de se juntar à conversa com a vizinhança da Rua de Baixo a conversar, às vezes com o desbulhar das feijoeiras como digestivo. Possuía a sabedoria que os livros não mostram, por isso ainda guardo algumas suas palavras sábias apenas ao alcance de quem tem as lições da vida bem sabidas e vividas de trás para a frente. Ela partiu num dia e no mesmo dia, exactamente dez redondos anos depois, nasceu a minha filha, para mim é um sinal, uma bênção, o que lhe queiram chamar. Para mim a Avó Julita é uma nuvem muito branca num fundo de céu azul claro como os seus olhos que anda por aí a olhar pelos filhos, netos, bisnetos, pelos que andam nos campos, contrabandistas e todos os que vierem por bem. Porque ela parada não fica. Saúde! Um abraço!

Manuel Pires

Em quanto tempo chega a desilusão?

Quanto tempo demoramos a desiludir alguém? E a ficar desiludidos? Há algum tempo tabelado, para sabermos o que é normal? Para sabermos se ainda é muito cedo para ser considerada desilusão, ou se, por outro lado, ainda está dentro do expectável e estamos só a empolar as circunstâncias? São perguntas pertinentes, que tivermos em conta que, hoje em dia, tudo parece descartável. Até as relações interpessoais. É tudo à velocidade da luz, num antigo “vai ser bom, não foi?”. De repente, parece que tudo já aconteceu, porque havia algum prazo de validade invisível. E nem sempre nos apercebemos disso. Vivemos na poesia de Álvaro de Campos, num “sentir tudo de todas as maneiras”. Mas só se for nos próximos cinco minutos, porque depois tenho mais o que fazer. Ou já passou a vontade. Ou era só mesmo isto, obrigada. Ou, se calhar, nem era bem isto que eu idealizava, agora que tirei os tais cinco minutos para pensar sobre o assunto. Quanto tempo é preciso para saber que desiludimos alguém? Talvez nem nunca saibamos, porque isso requer que a outra parte tenha o tal tempo e, claro, a disposição para nos dizer. E, sem dons de adivinhação, poderemos ficar para sempre na ignorância. Em boa verdade, às tantas queremos lá saber disso! Num momento, estamos muito próximos. No momento seguinte, somos completos estranhos. Mesmo sem dar muita importância, o que é certo é que é difícil não sentir a tal pontada de desilusão. “Ah, afinal era só isto!”, num anticlímax extremamente desagradável. Parece-me que não há muito tempo para ficar, simplesmente. Para ser, fazer, sentir. Sem grandes preocupações. Há sempre mais para além do momento que vivemos no presente, numa ânsia de agarrar o futuro, que ainda se está a desenhar. Ou melhor, que estamos somente a rabiscar. Porque é difícil fazer uma obra-prima quando se está com pressa. No máximo, dá para safar. O ideal seria termos tempo, paciência e um sorriso no rosto para aqueles que escolhemos ter na nossa vida. Que escolhemos, sim. Porque, mesmo quando dizemos que foi tudo um mero acaso (talvez tenha sido, quem sabe?), tivemos sempre a opção de dizer “sim” ou “não”. De dar um passo em frente ou de virar as costas. Mesmo quando a opção era caminhar a passo firme para o abismo, a escolha foi, em última análise, pessoal. Mas, tudo tem dois lados. Todas as histórias, melhor dizendo, têm dois lados. E nem sempre no final do abismo temos um trampolim ou uns braços abertos para nos receber. Às vezes, temos somente rocha à nossa espera, tão dura e fria como seria de esperar. Contudo, em boa verdade, apenas julgamos os nossos próprios abismos, sem saber quais são os lugares negros por onde pisam os outros. A tendência é, logicamente, para olhar para o nosso umbigo, e lamentar tudo que não nos corre de feição. Quanto tempo demoramos a ficar desiludidos? E a desiludir alguém? Será o tempo de chegar ao final de um abismo? De perceber se há almofadas fofas ou se há apenas calhaus? Bem, se assim for, então o melhor é aproveitar a queda.

Do outro lado da pena

O que há do outro lado da pena, o que é que nos espera, quem seremos nós, depois? Mais ou menos formulada, a questão impõe-se rapidamente depois do choque sofrido. Quando perdemos alguém que amávamos desde sempre, a mulher ou o homem de quem estamos apaixonados vira-nos as costas para sempre, e quando é um pai ou um irmão mais novo… A pena é algo muito diferente da infelicidade. Aquele que perde o seu trabalho, aquele que perde a casa, aquele que perde o seu país, aquele cujo filho acorda muito doente, essa pessoa não se questiona sobre o que há do outro lado, sabe que tudo vais ser muito difícil e que o desemprego, a rua, o exílio, o tormento vão durante muito tempo absorver todas as forças de que dispõe, a cada instante de cada dia da sua vida, num sombrio e longo presente. Como para a explosão das torres em Nova York, a queda do muro de Berlim, ou quando soubemos que Notre Dame de Paris estava a arder. Gostaríamos de o contar, mas contemo-nos, sabemos que isso não interessa a ninguém. Toda a gente estava em qualquer lado, toda a gente teve um sentimento arrepiante, assim como uma grande incredulidade face ao que via. Dor penosa, aconteceu há dois meses e já parece ter sido há muito, porque o tempo passa muito depressa. Para esta ideia de que em poucos dias, conseguiríamos de alguma forma habituar-nos aquilo que nos impedia de respirar e nos cortava o coração, atravessou-nos e revoltou-nos também no mais profundo de nós mesmos. A transformação em nós aconteceu e dura. Parece que por vezes até temos a consolação dum amigo, dum parente que nos quer aliviar o sofrimento partilhando-o connosco. Aquele que tenta consolar-nos não é forçosamente aquele que nos alivia. Pode ser um desconhecido de passagem, que nos liberta sem o saber, nos abre portas, nos põe em movimento. Além disso será que queremos mesmo abandonar essa pena que nos liga à nossa perda, ao nosso luto? Esta dor que é a nossa forma de amar ainda, que é o amor posto à prova da renúncia, queremos mesmo ser curados? É a memória do que foi, o rasto duma plenitude que nos fugiu. É-nos precioso e merece ser cultivado. Como tudo o que vive, conhecerá as estações, sonos e auroras resplandecentes, acompanhar- -nos-á para todo o lado onde formos. Os consoladores são aqueles que nos vão permitir levar connosco esta pena em vez de lhe sofrer o peso. Não é fácil admitir que há uma vida do outro lado da pena, do outro lado do arrancamento, do silêncio, da morte. Não é assim tão fácil aceitar mudar, para viver plenamente para além das lágrimas. Poderemos nós aceitar um dia secar as lágrimas e viver serenamente no companheirismo da ausência? Não seremos tentados a remoer? Nada é urgente. O tempo é nosso aliado. Não foi no dia seguinte que o Cristo voltou, foi ao terceiro dia! E três dias é o mínimo para admitirmos que a vida nos espera, do outro lado da pena. 

Compras online (Garantia dos produtos)

Com a propagação da pandemia, dispararam as compras através da internet. Há portugueses que estão agora, pela primeira vez, a fazer compras virtualmente. Nestas situações é importante redobrar a atenção, porque devemos não só ter vendedores responsáveis, mas também consumidores conscientes dos seus direitos no mundo virtual. As compras online funcionam como contratos feitos à distância, tornando- -se crucial conhecer todos os direitos e deveres envolvidos nestas transações. Informações como o prazo de entrega, o tempo de garantia dos produtos e a duração do contrato (caso se aplique) são de extrema importância e devem ser uma prioridade. Uma das questões que suscita mais dúvidas por parte dos consumidores é, sem dúvida, a garantia dos produtos comprados online no caso de os mesmos apresentarem defeito, sendo um produto com defeito aquele que não está conforme o produto encomendado ou que não funciona corretamente. A lei estabelece que os bens móveis têm um prazo de garantia mínima de dois anos, quer a compra seja feita numa loja física ou à distância. Durante este período, o vendedor é responsável pelos defeitos que apareçam. Entendemos, no caso das compras online, que o referido prazo deverá começar a contar a partir da data em que o consumidor recebe o bem que comprou, sendo o envio e entrega dos produtos da responsabilidade do vendedor. À partida, o consumidor tem o direito de escolher entre a reparação ou a substituição do produto, a redução adequada do preço, ou a resolução do contrato. No caso da reparação ou substituição, esta deverá ser feita gratuitamente no prazo máximo de 30 dias o que significa que os portes de envio, mão-de-obra e material estão a cargo do vendedor. Durante esse período, o prazo de garantia suspender-se-á, devendo, por isso, o tempo em que decorrer essa operação, ser acrescentado ao prazo inicial da garantia. Se o vendedor não puder reparar ou substituir o produto, deve então fazer uma redução do preço (devolução da diferença entre o valor pago e o valor do bem desconforme) ou a resolução do contrato e o reembolso do montante pago, incluindo os custos suportados com a entrega. Para o exercício do direito de garantia, o consumidor deve comunicar ao vendedor a falta de conformidade no prazo de dois meses, após a descoberta do defeito, descrever a natureza do defeito, podendo fazer-se valer de qualquer um dos direitos referidos anteriormente (salvo se tal se manifestar impossível ou constituir abuso de direito). Nesta e noutras questões, relacionadas com direito de consumo, não facilite. Faça valer os seus direitos, podendo sempre contar com o apoio de um Solicitador. Um solicitador, todos os serviços!

Cristela Freixo